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segunda-feira, 11 de abril de 2011

A consolidação do modelo Lula

Só vai depender da Dilma, isso se a oposição e o PIG não atrapalharem...

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Enviado por luisnassif,
seg, 11/04/2011-14:58

Os cem dias de Dilma
O modelo Lula
Para analisar os cem dias de Dilma, é necessário entender o projeto de país de Lula.
Não é um projeto teórico, fruto de elucubrações intelectuais. Mas algo que sai da própria formação política de Lula e ganha corpo especialmente quando pega as rédeas do governo – no segundo mandato.
A construção de um país não é algo linear. Ainda nos anos 90 insisti muito na visão de “movimento pendular” para explicar a dialética do desenvolvimento. A ausência dessa dialética é a principal responsável pelo envelhecimento de regimes e de países.

Cria-se um movimento em determinada direção – digamos o neoliberalismo avassalador do início e do fim do século 20. Esse movimento surge em contraposição ao centralismo do período anterior, corrige vícios e consolida novos vitoriosos.

O pêndulo volta-se para o lado oposto, gerando novos vícios. Os novos interesses hegemônicos impedem uma discussão objetiva sobre os ajustes necessários.

Em outros países desenvolvidos, há três instituições capazes de refazer esses equilíbrios:
  • universidades;
  • partidos políticos (com seus think tanks);
  • e mídia de opinião.

Como tenho reiterado, aqui há insuficiência nesses três polos, especialmente na mídia de opinião – um simulacro do que é o jornalismo de opinião em economias avançadas.

Sem esses anteparos, os movimentos pendulares se radicalizam.
  • Foi assim com o crescimento descomunal do centralismo do Estado brasileiro e do protecionismo econômico no período militar;
  • foi assim com o desmonte do Estado brasileiro; [primeiro mandato da "era FHC"]
  • e, no período posterior, a abertura irresponsável da economia, acompanhada de apreciação cambial. [segundo mandato da "era FHC"]
O que leva ao amadurecimento do país são os ajustes de rumo, sem grandes rompimentos, grandes traumas. reduzindo os ângulos de inflexão do pêndulo.
O ponto novo do projeto Lula – de certo modo semelhante ao projeto Vargas – é o de romper com essa dicotomia e passar a noção de conjunto – ou seja, somos todos peças de um mesmo todo; e esse todo é a soma de todas as peças Daí a importância da consolidação do sentimento de Nação e o papel do estadista na explicitação desse modelo.
Esse modelo foi exemplarmente explicado por Lula no evento de premiação da Carta Capital em 2009 [corregindo, foi em 18 de outubro de 2010]. No futuro será uma daquelas peças modelares da construção político-econômica brasileira, como foram os discursos de Vargas para os trabalhadores do Brasil, o de JK sobre os 50 anos em 5, o de Collor sobre as “carroças” brasileiras no início dos anos 90. Não consegui me lembrar de nenhum discurso siignificativo de FHC, a não ser as baboseiras sobre “a nova renascença”.


Fonte - YouTube - acessado em 18out2010

No evento da Carta Capital, Lula virou-se para Ivan Zurita, presidente da Nestlé, e lhe disse que os lucros da empresa eram excepcionais. E sabe a razão? Os recursos que iam para o Bolsa Família, o aumento do salário mínimo que permitiram o surgimento de uma nova classe consumidora.

Lula conseguiu conduzir a maior política de inclusão social do país minimizando os conflitos de maneira inédita na história contemporânea, justamente através dessa estratégia de juntar todas as peças e mostrar que o país era a soma de todos. Foi um jogo de ganha-ganha que tem seus custos.

A rigor, desde a criação do CDES (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social) no início do primeiro mandato, tinha-se essa visão clara, de somar e esvaziar os movimentos de radicalização. A própria consolidação do governo Lula como de centro-esquerda permitiu esse pacto econômico-social.

No final dos dois mandatos, tinha-se conseguido a pax de Lula. A prova estava nas entrevistas entusiasmadas de Roberto Setúbal, Abílio Diniz, Gerdau e outros campeões do setor privado.
Restou um ponto de conflito: a velha mídia com seu poder de influência sobre a classe média convencional – média e alta gerência, classe B menos.
Esse conflito se dava em cima de questões não essenciais, ou exploradas de forma maliciosa, como as relações diplomáticas com Venezuela, Cuba, a defesa do programa nuclear do Irã, a falácia do controle externo da mídia, a verborragia de Lula, especialmente no último ano. E preconceito, preconceito, preconceito.

Os desafios de Dilma
Primeiro desafio – desarmar o clima de guerra

No chamado campo psicossocial, o primeiro ato de Dilma foi esvaziar a tensão junto ao público midiático – velha mídia e a opinião pública midiática. Todos os fatores de desgaste foram trabalhados simultaneamente e com tal pontaria que faz crer que, por trás da escolha dos temas, estava algum estudo sistemático – provavelmente de João Santana.

Foi ao aniversário da Folha, condenou desrespeito aos direitos humanos no Irã, baixou a retórica em torno da Lei dos Meios, fez afagos públicos a FHC, reduziu ao máximo a exposição pública, mostrou que não seria uma estatista.

Havia várias razões para essa estratégia.

A mais óbvia é que não dá para governar em clima de guerra permanente. A segunda é que o melhor momento para promover a paz é o afago ao derrotado. A terceira é que o fim do clima de guerra ajudaria no salto final para o amadurecimento político brasileiro, enterrando de vez a tentativa de se criar o ambiente de esgoto na política.

Aliás, a declaração de FHC ao Poder Online, do iG, é o reconhecimento da eficácia da estratégia: “a oposição a Dilma Rousseff deve ser menos agressiva, o que ajudará a melhorar nossos costumes políticos". Tudo isso devido ao afago no mais descomunal ego da história política brasileira, provavelmente superior ao do próprio Ruy Barbosa.

O mais importante da história é que não houve mudança em nenhum ponto fundamental do modelo Lula. Pelo contrário, houve a consolidação. O único fator novo foi a mudança de retórica.

No caso da Lei Geral das Comunicações, desde o começo Franklin Martins salientava que seria em defesa dos meios de comunicação contra o poder dezenas de vezes maior das teles. Mas falava com impaciência, provavelmente irritado com a ignorância da velha mídia, de não perceber esse movimento. O clima bélico dava ênfase à retórica e não analisava o conteúdo.

O próprio Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) faz parte dessa estratégia ao criar alternativas de transmissão que passam ao largo do controle das teles.

Segundo desafio – consolidar o modelo gerencial

Esse desafio tem nuances interessantes.

Durante a campanha uma das bandeiras da candidatura José Serra era a imagem de bom gestor inteiramente construída pela velha mídia. Talvez tenha sido o mais ausente governador da história de São Paulo. De qualquer modo, era um dos pontos a tocar o imaginário da classe média midiática.

Por outro lado, embora o primeiro governo FHC tenha sido um desastre, em termos de contas públicas, a oposição brandiu sempre a bandeira do ajuste fiscal acima de qualquer outro valor.

O governo Lula atendeu o que era exigido pelo mercado – ajuste fiscal duro, para gerar superávit primário e compensar os juros exorbitantes do BC. Ao mesmo tempo, a camisa-de-força ideológica impedia qualquer ação proativa do Estado. A crise de 2008 abriu uma fenda nessa muralha e permitiu avançar nessa nova linha.

Por outro lado, provocou um aumento de despesas, exigindo uma freada de arrumação.

Dilma atuou nas duas linhas. Do lado das despesas, o corte de R$ 50 bi para redefinição das prioridades e ordenamento dos gatos – algo, como ela disse, que deve ser repetido sempre, para cortar despesas inúteis que se perpetuam pela inércia.

No campo administrativo – sua praia – montou rapidamente o modelo para substituir o anterior, que concentrava todo o esforço de coordenação na Casa Civil. Criou quatro eixos básicos – PAC, macroeconomia, políticas sociais e movimentos sociais -, cada qual com um objetivo claro, entregou a um Ministro respondendo diretamente a ela, coordenando as ações de cada ministério sobre o tema. E tratou de colocar administradores em lugar de políticos em áreas mais críticas da administração pública.

Foi não apenas um avanço em relação ao modelo anterior como permitiu, de maneira mais clara, à opinião pública entender a lógica de gestão.

Com isso antecipa-se ao novo movimento do pêndulo, que poderia ser explorado pela oposição – freada nas despesas e modelos de gestão – trazendo um componente novo: melhoria da qualidade dos gastos públicos através do aumento da eficácia da gestão.
Terceiro desafio – sair da armadilha mercadista

Diria que esse é a mãe de todas as batalhas.

Ao longo dos últimos 16 anos, a submissão ideológica (muito mais que técnica) aos cânones do mercado desviou recursos imensos de investimentos em infraestrutura, possibilidade de redução de carga tributária, melhoria dos gastos sociais.

Desde o segundo semestre do ano passado Fazenda e Banco Central (já sem a sombra de Henrique Meirelles) iniciaram o movimento lento, gradual, para mudar os paradigmas da política monetária.

Foram tomadas as chamadas medidas prudenciais, para reduzir o peso dos juros, gradativamente o BC está trabalhando seus próprios cenários e expectativas, sem ficar prisioneiro da pesquisa Focus, e houve mudanças que deixam à disposição da Fazenda intervir mais decididamente no mercado cambial. Embora nada tenha sido feito de mais relevante até agora. Além disso foi anunciada recentemente a ampliação do universo pesquisado pela Focus.

Esse desafio é complicado, porque no bojo de uma alta generalizada nos preços das commodities e no aquecimento de alguns setores da economia.

É um nó conjuntural, mas uma ameaça expressiva, que terá que ser trabalhada este ano. Até agora a Fazenda não tem se saído bem, embora os desafios sejam imensos.
O "pano de fundo" é o rearranjo político da economia.

Para minimizar pressões, a estratégia de Lula consistiu em atender à demanda de todos os setores.
  • Ao mercado, juros e câmbio apreciado;
  • às grandes empresas exportadoras, swap reverso (antes da crise);
  • aos grandes industriais, financiamentos do BNDES;
  • à classe média, uma economia aquecida;
  • aos movimentos sociais, espaço para atuação modernizadora.

A conta ficou alta, especialmente porque o maior preço – o do mercado financeiro – não foi reestruturado. Daí a importância desse ajuste na política monetária.

Fonte: Blog Luis Nassif

sábado, 9 de abril de 2011

Mensalão - A verdade sobre a conclusão do relatório da PF - Não houve mensalão e sim caixa dois

Não se trata de uma mera questão semântica nem, da nossa parte, um esforço para minimizar qualquer crime cometido pelo PT e por integrantes do governo Lula. CartaCapital, aliás, nunca defendeu a tese de que o caixa 2, associado a um intenso lobby e também alimentado com dinheiro público, seja menos grave que a compra de apoio parlamentar. A história do mensalão serve, na verdade, ao outro lado, àquele que nos acusa de parcialidade [o famoso PIG que reúne, dentre outras, 4 das grandes famílias midiáticas do brasil: a Globo, Abril, Estadão e a folha]. Primeiro, por ter o condão de circunscrever o escândalo apenas ao PT [escondendo os fatos que envolvem o PSDB] e, desta forma, usá-lo como instrumento da disputa de poder. Depois, por esconder a participação do banqueiro Daniel Dantas, cujos tentáculos na mídia CartaCapital denuncia há anos, e a do PSDB, legenda preferida dos patrões e seus prepostos nas redações. Em nome desta aliança, distorce-se e mente-se quando necessário. E às favas o jornalismo.

por: Editorial de Carta capital

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Da Carta Capital
Via Blog Luis Nassif

O escândalo do mensalão voltou à cena. Em páginas recheadas de gráficos, infográficos, tabelas e quadros de todos os tipos e tamanhos, a revista Época anunciou, na edição que chegou às bancas no sábado 2, ter encontrado a pedra fundamental da mais grave crise política do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, entre 2005 e 2006.

Com base em um relatório sigiloso da Polícia Federal, encaminhado ao Supremo Tribunal Federal, a semanal da Editora Globo concluiu sem mais delongas:

Na visão da Globo via sua revista "época":
a PF havia provado a existência do mensalão e o uso de dinheiro público no esquema administrado pelo publicitário Marcos Valério de Souza.
Outro aspecto da reportagem chamada atenção: o esforço comovente em esconder o papel do banqueiro Daniel Dantas no financiamento do valerioduto. Alguns trechos pareciam escritos para beatificar o dono do Opportunity, apresentado como um empresário achacado pela sanha petista por dinheiro.
As provas do descalabro estariam nas 332 páginas do inquérito 2.474, tocado pelo delegado Luiz Flávio Zampronha, da Divisão de Combate a Crimes Financeiros da PF e encaminhado ao ministro Joaquim Barbosa, relator no STF do processo do “mensalão”. Inspirados no relato de Época, editorialistas, colunistas e demais istas não tiveram dúvidas: o mensalão estava provado. Estranhamente, a mesma turma praticamente silenciou a respeito dos trechos que tratavam de Dantas.
Infelizmente, os leitores de Época não foram "informados" corretamente a respeito do conteúdo do relatório escrito, com bastante rigor e minúcias, pelo delegado Zampronha.
Em certa medida, sobretudo na informação básica mais propalada, a de que o “mensalão” havia sido confirmado, esses mesmos leitores foram enganados.

Não há uma única linha no texto que confirme a existência do tal esquema de pagamentos mensais a parlamentares da base governista em troca de apoio a projetos do governo no Congresso Nacional.

Ao contrário.

Em mais de uma passagem, o policial faz questão de frisar que o inquérito, longe de ser o “relatório final do mensalão”, é uma investigação suplementar do chamado “valerioduto”, solicitada pela Procuradoria Geral da República, para dar suporte à denúncia inicial, esta sim baseada na tese dos pagamentos mensais.
Trata, portanto, da complexa rede de arrecadação, distribuição e lavagem de dinheiro sujo montada por Marcos Valério.

Zampronha teve, inclusive, o trabalho de relatar como esse esquema a envolver financiamento ilegal de campanha e lobbies privados começou em 1999, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, e terminou em 2005, na administração Lula, após ser denunciado pelo deputado Roberto Jefferson, do PTB.

Ao longo do texto, fica clara a percepção do delegado de que nunca houve “mensalão” (o pagamento mensal a parlamentares), mas uma estratégia mafiosa de formação de caixa 2 e que avançaria sobre o dinheiro público de forma voraz caso não tivesse sido interrompida pela eclosão do escândalo.

Na quarta-feira 6, CartaCapital teve acesso ao relatório. Para não tornar seus leitores escravos da interpretação exclusiva da reportagem que se segue, decidiu publicar na internet (www.cartacapital.com.br) a íntegra do documento da Polícia Federal [os links estão no final do post]. Assim, os interessados poderão tirar suas próprias conclusões. 
Poderão verificar, por exemplo, que o delegado ateve-se a identificar as fontes de financiamento do valerioduto. E mais: notar que Dantas é o principal alvo do inquérito.
Ao contrário do que deu a entender a revista Época, não se trata do “relatório final” sobre o mensalão. Muito menos foi encomendado pelo ministro Barbosa para esclarecer “o maior escândalo de corrupção da República”, como adjetiva a semanal. Logo na abertura do relatório, Zampronha faz questão de explicar – e o fará em diversos trechos: a investigação serviu para consolidar as informações relativas às operações financeiras e de empréstimos fajutos do “núcleo Marcos Valério”.

Em seguida, trata, em 36 páginas (mais de 10% de todo o texto), das relações de Marcos Valério com Dantas e com os petistas. À página 222, anota, por exemplo: “Pelos elementos de prova reunidos no presente inquérito, contata-se que Marcos Valério atuava como interlocutor do Grupo Opportunity junto a representantes do Partido dos Trabalhadores, sendo possível concluir que os contratos (de publicidade) realmente foram firmados a título de remuneração pela intermediação de interesse junto a instâncias governamentais”.

O foco sobre Dantas não fez parte de uma estratégia pessoal do delegado. No fim do ano passado, a Procuradoria Geral da República determinou à PF a realização de diligências focadas no relacionamento do valerioduto com as empresas Brasil Telecom, Telemig Celular e Amazônia Celular. As três operadoras de telefonia, controladas à época pelo Opportunity, mantinham vultosos contratos com as agências DNA e SMP&B de Marcos Valério. Zampronha solicitou todos os documentos referentes a esses pagamentos, tais como contratos, recibos, notas fiscais e comprovantes de serviços prestados. A conclusão foi de que a dupla Dantas-Valério foi incapaz de comprovar os serviços contratados.

As análises financeiras dos laudos periciais encomendados ao Instituto Nacional de Criminalística da PF revelaram que, entre 1999 e 2002, no segundo governo FHC, apenas a Telemig Celular e a Amazônia Celular pagaram às empresas de Marcos Valério, via 1.169 depósitos em dinheiro, um total de 77,3 milhões de reais. Entre 2003 e 2005, no governo Lula, esses créditos, consumados por 585 depósitos das empresas de Dantas, chegaram a 87,4 milhões de reais. Ou seja, entre 1999 e 2005, o banqueiro irrigou o esquema de corrupção montado por Marcos Valério com nada menos que 164 milhões de reais. O cálculo pode estar muito abaixo do que realmente pode ter sido transferido, pois se baseia no que os federais conseguiram rastrear.
Segundo o relatório, existem triangulações financeiras típicas de pagamento de propina e lavagem de dinheiro. Em uma delas, realizada em 30 de julho de 2004, a Telemig Celular pagou 870 mil reais à SMP&B, depósito que se somou a outro, de 2,5 milhões de reais, feito pela Brasil Telecom. O total de 3,4 milhões de reais serviu de suporte para transferências feitas em favor da empresa Athenas Trading, no valor de 1,9 milhão de reais, e para a By Brasil Trading, de 976,8 mil reais, ambas utilizadas pelo esquema de Marcos Valério para mandar dinheiro ao exterior por meio de operações de câmbio irregulares, de modo a inviabilizar a identificação dos verdadeiros beneficiários dos recursos. Em consequência, Zampronha repassou ao Ministério Público Federal a função de investigar se houve efetiva prestação de serviços por parte das agências de Marcos Valério às empresas controladas pelo Opportunity.

A principal pista da participação de Dantas na irrigação do valerioduto surgiu, porém, a partir de uma auditoria interna da Brasil Telecom, realizada em 2006. Ali demonstrou-se que, às vésperas da instalação da CPMI dos Correios, em 2005, na esteira do escândalo do “mensalão” e no momento em que a permanência do Opportunity no comando da telefônica estava sob ameaça, a DNA e a SMP&B celebraram com a BrT contratos de 50 milhões de reais. Dessa forma, as duas empresas de Marcos Valério puderam, sozinhas, abocanhar 40% da verba publicitária da Brasil Telecom. Isso sem que a área de marketing da operadora tivesse sido consultada.

Ao delegado, Dantas afirmou que, a partir de 2000, ainda no governo FHC, passou a “sofrer pressões” da italiana Telecom Italia, sócia da BrT. Em 2003, já no governo Lula, o banqueiro afirma ter sido procurado pelo então ministro-chefe da Casa Civil, o ex-deputado José Dirceu, com quem teria se reunido em Brasília.

Na conversa com Dirceu, afirma Dantas, o ministro teria se mostrado interessado em resolver os problemas societários da BrT e encerrar o litígio do Opportunity com os fundos de pensão de empresas estatais. O Palácio do Planalto teria escalado o então presidente do Banco do Brasil, Cassio Casseb, para cuidar do assunto. Casseb viria a ser um dos alvos da arapongagem da Kroll a pedido do Opportunity. O caso, que envolveu a espionagem de integrantes do governo FHC e da administração Lula, baseou a Operação Chacal da PF em 2004.

Dantas afirmou ter se recusado a “negociar” com o PT. Após a recusam acrescenta, as pressões aumentaram e ele teria começado a ser perseguido pelo governo. Mas o banqueiro não foi capaz de provar nenhuma das acusações, embora seja claro que petistas se aproveitaram da guerra comercial na telefonia para extrair dinheiro do orelhudo. Só não sabiam com quem se metiam. Ou sabiam?

O fundador do Opportunity também repetiu a versão de que um de seus sócios, Carlos Rodemburg, havia sido procurado pelo então tesoureiro do PT, Delúbio Soares, acompanhado de Marcos Valério, para ser informado de um déficit de 50 milhões de reais nas contas do partido. Teria sido uma forma velada de pedido de propina, segundo Dantas, nunca consolidado. O próprio banqueiro, contudo, admitiu que Delúbio não insinuou dar nada em troca da eventual contribuição solicitada. Negou, também, que tenha mantido qualquer relação pessoal ou comercial com Marcos Valério, o que, à luz das provas recolhidas por Zampronha, soam como deboche. “O depoimento de Daniel Dantas está repleto de respostas evasivas e esquecimentos de datas e detalhes dos fatos”, informou no despacho ao ministro Barbosa.

Chamou a atenção do delegado o fato de os contratos da BrT com as agências de Marcos Valério terem somado os exatos 50 milhões de reais que teriam sido citados por Delúbio no encontro com Rodemburg. Para Zampronha, a soma dos contratos, assim como outras diligências realizadas pelo novo inquérito, “indicam claramente” que, por algum motivo, o Grupo Opportunity decidiu efetuar os repasses supostamente solicitados por Delúbio, com a intermediação das agências de Marcos Valério, como forma de dissimular os pagamentos.

Os contratos da DNA e da SMP&B com a Brasil Telecom, segundo Zampronha, obedecem a uma sofisticada técnica de lavagem de dinheiro, usada em todo o esquema de Marcos Valério, conhecida como commingling (mescla, em inglês). Consiste em misturar operações ilícitas com atividades comerciais legais, de modo a permitir que outras empresas privadas possam se valer dos mesmos mecanismos de simulação e superfaturamento de contratos de publicidade para encobrir dinheiro sujo. No caso da BrT, cada um dos contratos, no valor de 25 milhões de reais, exigia contratação de terceiros para serem executados. Além disso, havia a previsão de pagamento fixo de 187,5 mil reais mensais às duas agências do Valerioduto, referente à prestação de serviços de “mídia e produção”.

Surpreendentemente, e contra todas as evidências, Dantas disse nunca ter participado da administração da BrT. Por essa razão, não teria condições de prestar qualquer informação sobre os contratos firmados pela então presidente da empresa, Carla Cicco, indicada por ele, com as agências de Marcos Valério. De volta a Itália desde 2005, Carla Cicco informou à PF não ter tido qualquer participação ou influência na contratação das agências, apesar de admitir ter assinado os contratos. Disse ter se encontrado com Marcos Valério uma única vez, numa reunião de trabalho com representantes da DNA.
O protagonismo de Dantas no valerioduto e o desmembramento da rede de negócios montada por Marcos Valério, desde 1999, nos governos do PSDB e do PT são elementos que, no relatório da PF, desmontam, por si só, a tese do pagamento de propinas mensais a parlamentares. Ou seja, a tese do “mensalão”, na qual se baseou a denúncia da PGR encaminhada ao Supremo, não encontra respaldo na investigação de Zampronha, a ponto de sequer ser considerada como ponto de análise.
O foco do delegado é outro crime, gravíssimo e comum ao sistema político brasileiro, de financiamento partidário baseado em arrecadação ilícita, montagem de caixa 2 e, passadas as eleições, divisão ilegal de restos de campanha a aliados e correligionários. Por essa razão, ele encomendou os novos laudos detalhados ao INC.

Uma das primeiras conclusões dos laudos de exame contábil foi que Marcos Valério usava a DNA Propaganda para desviar recursos do Fundo de Incentivo Visanet, empresa com participação acionária do Banco do Brasil, e distribui-los aos participantes do esquema do PT e de partidos aliados. O fundo foi criado em 2001 com o objetivo de financiar ações de marketing para incentivar o uso de cartões da bandeira Visa. O Visanet foi, inicialmente, constituído com recursos da Companhia Brasileira de Meios e Pagamentos (CBMP), nome oficial da empresa privada Visanet, e distribuído em cotas proporcionais de um total de 492 milhões de reais a 26 acionistas. Além do BB participam o Bradesco, Itaú, HSBC, Santander, Rural, e até mesmo o Panamericano, vendido recentemente por Silvio Santos ao banqueiro André Esteves. “Para operar tais desvios, Marcos Valério aproveita-se da confusão existente entre a verba oriunda do Fundo de Incentivo Visanet e aquela relacionada ao orçamento de publicidade próprio do Banco do Brasil”, anotou o policial.

O BB repassava mais de 30% do volume distribuído pelo fundo, cerca de 147,6 milhões de reais, valor correspondente à participação da instituição no capital da Visanet. Desse total, apenas a DNA Propaganda recebeu 60,5% do dinheiro, cerca de 90 milhões de reais, entre 2001 e 2005, divididos por dois anos no governo FHC, e por dois anos e meio, no governo Lula. Daí a constatação de que, de fato, por meio da Visanet, o valerioduto foi irrigado com dinheiro público. O que nunca se falou, contudo, é que essa sangria não se deu somente durante o governo petista, embora tenha sido nele o período de maior fartura da atividade criminosa. Quando eram os tucanos a coordenar o fundo, Marcos Valério meteu a mão em ao menos 17,2 milhões de reais.

De acordo com o relatório da PF, Marcos Valério tinha consciência de que agências de publicidade e propaganda representavam um mecanismo eficaz para desviar dinheiro público, por conta do caráter subjetivo dos serviços demandados. Mas havia um detalhe mais importante, como percebeu Zampronha. Com as agências, Valério passou a lidar com a compra de espaços publicitários em diversos veículos de comunicação. “Esta relação econômica estreitava o vínculo do empresário com tais veículos e poderia facilitar o direcionamento de coberturas jornalísticas”.
As Organizações Globo, proprietária da revista Época, sonegou a seus leitores, por exemplo, ter sido a maior beneficiária de uma das principais empresas do valerioduto.

À página 68 do relatório, e em outras tantas, a TV Globo é citada explicitamente. Escreve o delegado: “A nota emitida pela empresa de comunicação destaca-se por sua natureza fiscal de adiantamento, “publicidade futura”, isto é, a nota por si só não traz qualquer prestação de serviço, como também não há elementos que vincule os valores adiantados ao fundo de incentivo Visanet”. 
Zampronha se referia a contratos firmados em 2003 no valor de 720 mil reais e 2,88 milhões de reais. Entre 2004 e 2005, a TV Globo receberia outros pagamentos da DNA, no valor total de 1,2 milhão de reais, lançados na planilha de controle do Fundo Visanet.
Mesmo tratado com simpatia na reportagem da Época, o Opportunity [de Daniel Dantas] não perdoou.
No item 17 de uma longa nota oficial em resposta, o banco atira: “Na Telemig, segundo informações prestadas à CPI do Mensalão, a maioria dos recursos eram repassados às Organizações Globo. Por isso, a apuração desses fatos fica fácil de ser feita pela Época.”
Segundo Zampronha, o objetivo do valerioduto era criar empresas de fachada para auxiliar na movimentação de dinheiro sujo e manter os interessados longe dos órgãos oficiais de fiscalização e controle. O leque de agremiações políticas para as quais Marcos Valério “prestava serviços” era tão grande que não restou dúvida ao delegado: “Estamos diante de um profissional sem qualquer viés partidário”. Isso não minimiza o fato de o PT, além de qualquer outra legenda, ter se lambuzado no esquema. Não fosse a denúncia de Jefferson, o valerioduto teria se inscrutado de forma absoluta no Estado brasileiro e se transformado em uma torneira permanemente aberta por onde jorraria dinheiro público para os cofres petistas.

CartaCapital não espera, como de costume, que esta reportagem tenha repercussões na mídia nativa. À exceção da desbotada tese do mensalão, que serve à disputa político-partidária na qual os meios de comunicação atuam como protagonistas, não há nenhum interesse em elucidar os fatos. O que, se assim for, provará que a sociedade afluente navega tranquilamente sobre o velho mar de lama.
Leia a íntegra do relatório:
 Parte 1, Parte 2, Parte 3, Parte 4, Parte 5, Parte 6, Parte 7 e Parte 8
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